sexta-feira, julho 30, 2004

As associações de estudantes

A minha profissão obriga-me, de vez em quando, a contactar com dirigentes das associações de estudantes.
De imediato se torna evidente que estes, de agora, nada têm a ver com os do meu tempo de estudante (princípios dos anos 70).
Nessa altura, os dirigentes estudantis estavam entre os melhores de nós. Na sua esmagadora maioria, eram cultos e idealistas, estudantes brilhantes e apaixonados militantes políticos e sociais - quando isso era, o mais das vezes, um passaporte para a prisão ou para uma ida antecipada para a guerra do Ultramar.
Arriscavam o coiro todos os dias frente à PIDE/DGS e à polícia de choque.

Os de agora, são aprendizes de quadros políticos dos partidos do "centrão", cinzentos carreiristas que usam as associações como trampolim para subir na hierarquia das juventudes partidárias e chegar o mais cedo possível à nomenclatura do partido, com um olho em São Bento ou mesmo nas listas das europeias.
É uma espécie de estágio. E bem remunerado.
As associações de estudantes são hoje autênticas empresas, com volumes de negócios anuais apreciáveis - muitas centenas de milhares de contos em dinheiro antigo - cujo principal objectivo é organizar as milionárias queimas das fitas, festas de curso, viagens de finalistas e vender fotocópias.
Há aqui muito dinheiro a ganhar.
Por isso os jovens dirigentes empresariais/estudantis vão chumbando ano atrás ano, de forma a manter a sua base de poder e a continuar em posição de partilhar o chorudo bolo da queima das fitas e actividades correlativas. E do negócio desenfreado das fotocópias dos livros de texto, em flagrante violação dos direitos de autor. Feito o mais das vezes em vil associação com professores, muitos dos quais se esmeram em recomendar livros impossíveis de encontrar de modo a que a negociata prossiga, de vento em popa.

Nos anos setenta, esta maltinha ia toda parar às fileiras da União Nacional (depois Acção Nacional Popular, com Marcello Caetano) porque era ali que podiam esperar um lugar confortável sob a tutelar sombra do regime, era ali que se podiam canditatar aos pedaços ou migalhas que o regime ia dispensando, controladamente, aos seus fiéis servidores.
É nestas autênticas universidades da traficância política que se formam, de negociata em negociata, com alguma "contestação" pelo meio ao ministro da Educação de turno (há que manter as aparências e motivos não faltam) os dirigentes políticos do futuro.

Haverá contadas excepções. Mas não passam disso, excepções. Infelizmente!
É isto o futuro de Portugal? Pobre país...!!!

quinta-feira, julho 29, 2004

O blogue sem imagens

Comecei o blogue há um mês. Poucos dias depois, achei que o blogue estava algo aborrecido porque não tinha imagens.
Uma imagem do Carlos Paredes, de uma guitarra portuguesa, da bandeira de Portugal ou de Miranda do Douro dariam outra atractividade a estas linhas...
Além do que as próprias imagens, em alguns casos, podem funcionar, por si sós ou com uma breve legenda, como depoimentos poderosos.

Vai daí, pedi a um amigo que dá pela alcunha de Libelinha, que já tem uma apreciável experiência bloguística - e que só não linko aqui porque não sei linkar - para me ensinar a meter imagens no blogue e ele prontificou-se. Parei o blogue (também havia o Euro e a festa...) e fiquei à espera três semanas para recomeçar já com imagens.
Mas o amigo Libelinha até agora, népias.
Por isso cá estou de novo, algo tristinho, sem imagens...
Lá terei que arranjar outro assessor bloguístico para me ajudar com as imagens e os links.

Madredeus - parte 2

Já agora vale a pena ir ver o site dos ditos Madredeus.
É bonito à primeira vista, mas depressa se revela aborrecido e pastoso como a sua música. Depressa se começa a detestar navegar ali, naquelas águas paradas. Ou seja, igualzinho à música deles, um espelho...
É só escrever Madredeus no Google e carregar no botão "I feel lucky", ou "Sinto-me com sorte".
Já agora, só queria que vissem o texto que o Pedro Ayres Magalhães (PAM) escreveu (!?) para o press-release que acompanhava o disco. É um rol de baboseiras pretensiosas, inaguentável, sobre o amor infinito que dão e que recebem do seu publicozinho. De uma confrangedora probreza mental. Nem o Santana Lopes.
E o pior é que o gajo (o PAM) se toma a sério. O PAM não se enxerga!!!
(Pelo menos o Santana estou certo que não se toma a sério. Tem mesmo uma carinha de "Já enganei mais um!" a seguir às baboseiras que diz...)

Ódios de estimação - 1: Os Madredeus

Os Madredeus (a partir de agora designados "os ditos") acabam de lançar mais um disco. É o oitavo, de acordo com a discografia no seu site.
Reparei nisto porque recebi hoje um press-release anunciando que eles vêm ao Porto apresentar o novo disco - chamado "Amor Infinito" - a 5 de Junho, nos jardins do Palácio de Cristal.
Embora oiça imensa rádio, possivelmente passaria muito tempo sem reparar que os ditos tinham um novo disco. Porque por mais discos que lancem, os ditos estão a tocar sempre o mesmo disco, vezes sem conta. Não sabem tocar outra coisa.
Inventaram uma fórmula. Tocar com instrumentos acústicos uma música que tem algo de popular, de português, de urbano, com um verniz de música erudita que lhe é conferida pelo instrumental que escolheram, que é todo acústico, com guitarras, violoncelo, acordeão, de vez em quando, mais a bela voz da Teresa Salgueiro. Ela não tem culpa...
A fórmula seduziu-me. Gostei do primeiro disco, a princípio. Eu e muita mais gente. Mas não cheguei a ouvi-lo muitas vezes. Porque rapidamente me cansou.
Na música, como em toda a arte, atrai-me quem inova, quem se aventura e arrisca quem desbrava e nos oferece novos terrenos sonoros para habitar.
E o que os ditos descobriram não era propriamente um terreno novo, era mais propriamente uma nesga, realmente pouca coisa. E a gente aborrece-se de espaços pequenos, por mais atraentes que possam parecer à primeira vista.
Tinha curiosidade pelo que se iria seguir àquele primeiro disco. O normal é que a um primeiro esboço se seguissem traços mais carregados, cores e formas novas, aventura, risco...
Qual quê...!!! O segundo disco e era apenas mais do mesmo, sem tirar nem pôr. E o terceiro, idem, aspas. E o quarto e aí por diante até ao oitavo, que acaba de sair. Está a soar na rádio e no breve tempo que deixo escoar até mudar a estação confirma-se que nada mudou.
E assim a minha curiosidade se mudou em irritação primeiro e em desprezo depois. Inventaram uma fórmula que resultou comercialmente e quedaram-se, contentes, por aí. Vivem confortavelmente desde há 17 anos com isto. Ou seja, isto nada tem que ver com arte. Isto não é sério.
Francamente, não entendo como é que alguém constrói uma prisão para se meter lá dentro o resto da vida.

Dezassete anos passaram desde o primeiro disco, milhões de quilómetros foram percorridos em digressão, oito discos - e sempre, sempre a mesma música.
Tudo debitado com uma pose estudada, imitando no vestir e na maneira como estão em palco os "músicos sérios".
Vende bem, a fórmula. Em sectores restritos, é certo, o que se chama um nicho de mercado, mas espalhado por todos os países do mundo. Vende bem mas cheira mal!
O consumidor típico deste produto será essencialmente urbano, gosta vagamente de música, mas não se interessa muito pelo fenómeno. Tem alguns 30 ou 40 discos "fixes" lá em casa. Vê esta música como um produto sofisticado, com um som algo "clássico", de que fica bem gostar.
Lembram-se daquele ubícuo poster de há alguns anos, com um menino com uma lágrima ao canto do olho?
Os Madredeus estão para a música como esse célebre poster está para a pintura.
Até quando abusarão da nossa paciência?

sábado, julho 24, 2004

Carlos Paredes - 2

Luto nacional para Carlos Paredes parece-me muito bem, inteiramente justificado.
Só não percebo como é que não aconteceu o mesmo com a Sofia a quem certamente o país não deve menos que a Carlos Paredes...
Também Maria de Lurdes Pintasilgo merecia do Estado Português, da democracia portuguesa, um reconhecimento especial.

sexta-feira, julho 23, 2004

Carlos Paredes, Portugal

Carlos Paredes é um gigante da música do século XX. Do mundo. É o poeta do som de Portugal.
Ele pegou num instrumento até então secundário - a guitarra portuguesa - e levou-o para o centro do palco, para o lugar de honra dos cartazes. Um caso raríssimo na música instrumental de raiz popular.
Paredes comprova que não há instrumentos secundários. Os limites de qualquer instrumento são os do músico que o toca. Por isso, foi com ele que a guitarra portuguesa ganhou maioridade e voz própria.
Trouxe também à música portuguesa, o prazer imenso - e a vertigem - da grande música improvisada - termo enganador, porque a música improvisada só é grande quando precedida do sofrimento do exercício obstinado, mil vezes ensaiado, para que a música possa sair livre do espírito, tendo no corpo do instrumentista apenas um humilde serventuário.
Não se pode cantar a música de Carlos Paredes porque sua guitarra tem dentro de si todas as canções do mundo, todas as poesias do mundo... milhões de vozes, milhões de palavras. Não há voz humana que consiga conter em si tudo isto, só a guitarra de Paredes.
Cada nota da Paredes contém mil poemas. Mil vidas entre um dedo que aperta uma corda e o outro, percutindo-a.
Está lá toda a poesia, o mar, rios, montanhas, cidades, todas as paisagens de Portugal, as nossas paixões, os nossos desgostos, as nossas alegrias, sabores, gostos, todos os sentimentos de Portugal.
Ninguém conseguiu até hoje concentrar numa qualquer forma de expressão artística o espírito deste país como Carlos Paredes.
Só é comparável com Amália.
Mas eu gosto mais de ouvir Carlos Paredes.